No dia da aparição de Nossa Senhora de Fátima, o Oje consegue o milagre da aparição de Nossa Senhora Maria Duarte Bello, padroeira da etiqueta e do bem parecer, na página 14 do diário de cunho económico.
Qual Bíblia dos bons modos, o Oje publica Os 10 Mandamentos do comportamento à mesa avançados pela profissional do coaching e gestão de imagem à qual, a partir deste dia determinante, passo a prestar homenagem partilhando com todos vós as regras do saber estar entre copos e pratos.
No dia em que se pagam promessas, ofereço a minha devoção a Nossa Senhora e deixo a minha jura: irei acatar com os 10 mandamentos em toda e qualquer mesa que tiver o privilégio de sentar o meu corpinho tão bem comportado a partir de hoje.
E, agora, com os devidos comentários, os 10 Mandamentos.
1º Abolir o desejar bom apetite. É um hábito em desuso e pouco elegante.
(Mais fashion é desejar que o repasto caia muito mal e que azede a boquinha do mais doce convidado. Melhor, é nem esperar que todos estejam servidos para começar a accionar o maxilar).
2º Postura adequada. Sentado de costas bem direitas, levando o talher à boca e não a boca ao talher. Os cotovelos não devem estar apoiados na mesa enquanto come, só os pulsos. Não descalçar os sapatos debaixo da mesa.
(Espera lá, “não descalçar os sapatos debaixo da mesa”? Parece que a Nossa Senhora Maria Duarte Bello não é assim tão casta e já está a imaginar cenários de sedução assente no numerito da tipa que se descalça para descansar os delicados e atrevidos pés no “colo” do senhor elegante da frente. Minhas senhoras amigas de aventuras deste género, vamos então atacar assim mesmo, com os sapatos de biqueira afiada devidamente calçados. Na vida, há que deixar marcas).
3º Saber usar o guardanapo. Deve colocar-se sobre o colo e não enfiar na gola ou fazer dele um avental. Limpar sempre os lábios antes e depois de beber para não deixar marcas no copo. Quando se levantar da mesa coloque à esquerda do prato sem o dobrar.
(Ora aqui está algo genial…fazer do guardanapo um avental. Desconheço a técnica. Por acaso, os guardanapos de papel a que estou habituada, da marca Sou, permitem, em dimensão e resistência, fazer as coisas mais geniais. Por acaso, enquanto espero pelo prato, costumo criar vestidos de noiva, tendas de campismo, cortinados e jogos de cama. Aventais, por acaso, nunca experimentei, mas agora percebo que não é de bom tom).
4º Uso correcto dos talheres. A faca é o único talher que não é levado à boca. Os alimentos devem ser cortados e comidos um bocadinho de cada vez. A faca é dispensada quando os alimentos podem ser cortados sem dificuldade com garfo, como lasanha, ovos mexidos e saladas. Usa-se as mãos para partir pão, comer espargos, marisco e frutas de pequenas dimensões como cerejas e tâmaras.
(É bom saber que há alguém que se preocupa com a nossa saúde. Os meus pais nunca me ensinaram que as facas não se levam à boca. Toda a vida sofri de cieiro nos lábios…não é mãe? Afinal, eram as facas com que comia que me estavam a maltratar. Maria Duarte, és o meu anjo da guarda. Nunca mais levo uma faca à boca).
5º Tossir ou espirrar. O mais discreto que conseguir e nunca em direcção aos vizinhos de mesa ou respectivos pratos. Para assoar dá-se uma volta ao corpo, afastando-se ligeiramente com o mínimo de ruído sem olhar para o lenço e dobrando rapidamente. Caso necessário pedir licença para sair da mesa e voltar recomposto.
Sou uma reles pecadora. Aos teus joelhos me vergo Nossa Senhora. Uma vez, uma única vez, atenção, o acto de assoar não foi tão silencioso como gostaria. E uma outra vez, na volta da saída para uma valente assoadela, não regressei devidamente recomposta. Tinha o cabelo um pouco desalinhado do vento que se fazia sentir na rua e, pior, na ausência de lenços, tive de recorrer a um guardanapo de papel. A parte boa é que não o estava a usar como avental).
6º Evitar gestos vulgares. Não emitir ruídos ao mastigar ou engolir, não inclinar a cabeça sobre o prato. Não cheirar nem afastar a comida com o garfo para a beira do prato. Mastigar com a boca fechada e só após ter engolido se leva outro pedaço à boca. Não beber e mastigar em simultâneo.
(Pronto, este mandamento é lei para a vida. “Só após ter engolido se leva outro pedaço à boca”. Aqui está uma dica preciosa e altamente inovadora. Toda a parte dos ruídos cheira-me a algo de subliminar como “basicamente, não comam. Vivam do ar que é bem mais fashion e não engorda”. Para Nossa Senhora, alimentos como pão torrado, batatas fritas tipo pála-pála, bolachas ou massa folhada, não fazem parte da roda alimentar).
7º Conversa equilibrada. Evitar dirigir-se sempre à mesma pessoa evidenciando preferência. Equilibrar o tempo na conversa que mantém à direita e à esquerda.
(Eu sabia, o senhor engraçado que falou muito comigo num jantar em que era a única portuguesa num raio de 100 Kms, viu em mim a eleita para a vida. Logo vi que fui a preferida do senhor que tinha, ao lado direito, uma loira lindíssima que, para além de não falar uma palavra de português e inglês, não parava de comer).
8º Valorizar a qualidade e o aroma. O vinho deve ser bebido lentamente não esvaziando o copo de uma só vez. Não se ergue demasiado o copo e muito menos
inclina a cabeça para trás como fazem os passarinhos.
(Acabaram-se os penalties meus amigos. Mas, pior do que isso, acabaram-se as imitações de passarinhos. Sim, eu sei que imitava muito bem um lindo rosicolor, mas isso acabou-se. A partir de agora, beber vinho ganhou uma dimensão espiritual e espero que o respeitem).
9º Minimizar os incidentes. Não chamar a atenção para um copo ou talher sujo, cabelo
no prato ou um visitante indesejável na salada (com excepção de refeições no restaurante e mesmo assim com discrição). Se entornar vinho sobre a toalha desculpe-se, se o fizer no vizinho de mesa ofereça-se para ajudar sem insistir exageradamente.
(A partir de hoje, as minhas refeições vão pautar pela minimização de incidentes. Visitantes indesejáveis na salada passam a ser bem-vindos. Aliás, sempre defendi que fauna e flora não devem ser separados. Fica a dúvida: o que faço se entornar vinho sobre mim mesma?).
10º Para brindar. Os brindes fazem-se no final da refeição após um discurso. Levantar o cálice e beber sem bater com os copos uns nos outros ou proferir o conhecido tchim-tchim. Quem é abstémio, finge beber. Desastre total é ter um copo na mão com o dedo mínimo levantado.
(Nossa Senhora, agora é que me tramou. Então, agora só vou poder brindar no final da refeição e depois de um discurso? Pior, não posso levantar o dedo mínimo? Não sei se vou conseguir cumprir com estes mandamentos. Confesso que será mais difícil do que pensava, mas agrada-me que seja de bom tom fingir beber quando se é abstémio. Será que, num rasgo de altruísmo, posso também beber do copo do fingidor? Prometo que o farei muito discretamente).
4 comentários:
Hilariante! Ainda me estou a rir. Coitados dos amadores das Produções Fictícias.
Andreia que tu és um génio já todos sabíamos...Mas lamento informar-te que esta senhora te superou! Ainda estou a pensar no que significa "beber imitando os passarinhos". Eu sei que sou ignorante mas jamais tinha ouvido semelhante expressão e desconhecia que os pobres pássaros davam no álcool! O filme do Hitchcock está justificado! Os passaritos tavam todos com um copito a mais!
É verdade meus caros, a Maria Duarte Bello é um verdadeiro achado do humor nacional. Qualquer dia é vê-la na última da Visão a imitar passarinhos!
Minha querida,
Eu próprio sou, confesso, um adepto da etiqueta e do saber-estar. Mais ainda quando tudo isto vem recheado de pedantismos insuportáveis e considerações estranhas das quais o já cliché "beber como os passarinhos" é expoente máximo.
É que vou já deitar o meu "Absolutamente Tias de Pureza Teixeira da Cunha" fora e guardar um espaço para o livro que, anseio, Maria Duarte Bello decida escrever. Até calha bem porque fica tudo na parte do humor lá na biblioteca, tá a ver?
Bem, será que ela também é contra dar só um beijinho? Bem, é que morria já só de pensar nas dezenas de pessoas que não mais vou poder deixar de cara pendurada!
Espero que continue a publicar coisas desta querida.
Beijinho, só um, mas face com face, com a cabeça direita e não levantada como os passarinhos e sem o mínimo minimamente esticado, sei lá...
Enviar um comentário